17/12/2014
Relatório do Senado norte-americano sobre a utilização da tortura pela CIA (debate)
O relatório do Senado confirma tudo aquilo que os relatórios do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa já haviam exposto desde 2007, mas acrescenta novos detalhes acabrunhantes, quer sobre a tortura e outros crimes praticados pela CIA no programa das extraordinary renditions , quer sobre a rede de prisões secretas para deslocalizar e subcontratar a tortura a esbirros de Assad, de Gaddafi ou Mubarak, quer sobre a extensão da mentira e a omissão da CIA e da Administração Bush para enganar o Congresso e a opinião pública americana e mundial.
Vários governos europeus podem também ter sido enganados, mas outros sabiam e foram coniventes com a operação da CIA. O Senado bloqueia os nomes de 25 países europeus. Cabe a este Parlamento expor quais são. Alguns dos cúmplices não se limitaram a autorizar sobrevoos de aviões para transportar os prisioneiros. O Senado confirma que houve prisões secretas na Europa. A Polónia, a Lituânia e a Roménia já tiveram de admitir aquilo que negaram junto deste Parlamento. O Parlamento Europeu tem o dever de reinstaurar um mecanismo de averiguação da participação de Estados-Membros da União Europeia neste programa levado a cabo prelos Estados Unidos. É essencial acabar com a impunidade.
Pelo meu país, Portugal, passaram os primeiros voos que transportaram suspeitos de terroristas para Guantánamo a 11 de novembro de 2002. Entre sobrevoos, voos, escalas, paragens técnicas, entre 2002 e 2007 são mais de cem vezes em que a CIA utilizou o território português no processo de cometer estes crimes. Mas falta ainda esclarecer se as autoridades portuguesas foram só tolinhas e incompetentes e enganadas pelos Estados Unidos ou se foram cúmplices e participantes ativos neste programa?
Está ainda por apurar se as escalas implicaram detenção e tortura em solo nacional, por exemplo na base das Lages, nos Açores. O governo do meu partido - digo com vergonha e amargura - a partir de 2006, fez tudo para obstruir o conhecimento da verdade impedindo um inquérito parlamentar, dificultando um inquérito judicial, impedindo um escrutínio aos serviços secretos, e sonegando ao Parlamento Europeu e ao parlamento nacional listas de voos autorizados de e para Guantánamo que eu consegui obter e entreguei à comissão de inquérito deste Parlamento.
Termino, Senhor Presidente, dizendo que todos estes esforços foram para encobrir responsabilidades próprias e para não comprometer as chances de reconduzir a chefia da Comissão Europeia, o ex-Primeiro Ministro de Portugal, Durão Barroso, que, entre 2002 e 2005, foi cúmplice ativo deste programa da CIA. Apurar a verdade em Portugal importa a Portugal e importa à Europa.
(O orador aceita responder a uma pergunta "cartão azul" (n.º 8 do artigo 162.º))